Nota
da AJE-Brasil Sobre o Zika Vírus e a Microcefalia
1. A
AJE-Brasil (Associação Jurídico-Espírita do Brasil) posiciona-se contrariamente
à proposta de se estender as hipóteses de aborto legal às mulheres grávidas
infectadas pelo zika vírus, como forma de se evitar o nascimento de crianças
que possam vir a sofrer de microcefalia, como vem sendo reivindicado por
parcela da imprensa e da sociedade civil. E assim o faz por diversas razões:
·
o
aborto é contrário ao fundamental direito à vida e encontra suas excepcionais
hipóteses previstas restritivamente em lei e num específico caso de construção
jurisprudencial;
·
a
microcefalia não é incompatível com a vida, podendo tão somente acarretar
deficiências, tal como em diversas outras síndromes;
·
a
autorização para a prática do aborto com base em mero prognóstico (já que o diagnóstico
de microcefalia só se consegue próximo do final da gestação) é medida que
afronta a leitura restritiva que há de ser feita das hipóteses legais de
abortamento;
·
a
autorização para a eliminação da vida como modo de se evitar o nascimento de
criança com deficiência é medida de eugenia que contraria os princípios
constitucionais da dignidade da pessoa humana e da solidariedade.
2. Por outro lado, a AJE-Brasil apela às gestantes que tenham sido infectadas com o zika vírus que mantenham a gravidez e recebam com amor e dedicação seus filhos, ainda que acometidos de alguma deficiência.
Compreende-se a dor e a aflição da gestante e do pai diante da notícia de um possível diagnóstico de microcefalia do filho, o que lhes exigirá a superação do equívoco de que apenas as vidas perfeitas valem a pena ser vividas; e lhes despertará para o intenso amor que demanda maior dedicação e entrega à delicada criança, numa experiência de singular sensibilidade
3. Ademais, diante do aumento de casos de crianças com microcefalia, a AJE-Brasil concita a sociedade brasileira como um todo e os poderes públicos em particular a adotarem providências que garantam o necessário apoio material e moral às gestantes e seus companheiros, para que bem possam levar a termo a gravidez. E também a adotarem providências efetivas que garantam a atenção e o desenvolvimento das crianças com deficiência.
Cabe ao Poder Público, em suas três
esferas de poder e de acordo com as atribuições constitucionais de
competências, fortalecer, com urgência, a rede SUS para acolher as gestantes
infectadas pelo zika vírus, garantindo-lhes pré-natal e parto com as especificidades
inerentes a tal situação, bem como assegurando às crianças que vierem a nascer
com eventuais deficiências decorrentes de microcefalia, por meio de eficiente Rede de Apoio Psicossocial,
atendimento médico, psicológico, terapêutico e fonoaudiológico necessários e
efetivos, a tempo e modo, de maneira a lhes assegurar, em sua máxima
potencialidade possível, seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual
e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Cabe ao Poder Público, ainda, em suas três
esferas de poder e de acordo com as atribuições constitucionais de
competências, fortalecer, com urgência, a rede SUAS para acolher, com serviços
e programas específicos, as gestantes infectadas pelo zika vírus que necessitem
da assistência social, bem como para assegurar às crianças que vierem a nascer
com eventuais deficiências decorrentes de microcefalia, se deles necessitarem,
os recursos da assistência social, dentre os quais a concessão de Benefício de
Prestação Continuada.
Cabe também ao Poder Público, em suas
três esferas de poder e de acordo com as
atribuições constitucionais de competências, promover, sem demora, as obras civis necessárias a garantir o acesso da totalidade da população brasileira ao saneamento básico, com fornecimento de água tratada e com
coleta e tratamento de esgoto em prazos urgentes, como modo eficaz de
eliminação do vetor da moléstia.
4. Por
fim, a AJE-Brasil convoca os órgãos do Movimento Espírita brasileiro (entidades
federativas, entidades especializadas e centros espíritas) e aos espíritas em
geral, a organizarem programas e serviços assistenciais voluntários destinados
ao acolhimento emocional e espiritual das gestantes que tiverem sido infectadas
com o zika vírus, bem como ao pleno desenvolvimento físico, mental, moral,
espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade, dos filhos que
vierem a nascer com eventuais deficiências decorrentes da microcefalia.
5. A
AJE-Brasil reitera sua convicção de que a defesa da vida humana – qualquer que
seja sua condição física ou mental –, a empatia diante do sofrimento alheio, o
acolhimento fraterno às pessoas que enfrentam dificuldades em suas trajetórias
existenciais e a dedicação solidária ao próximo são lições consagradas pelo
Cristianismo e adotadas pela Doutrina Espírita codificada por Allan Kardec, mas
que caracterizam todo ser humano, independentemente de denominação religiosa ou
ausência de religião, como reverência à dignidade humana e como expressão de
incondicionado amor ao homem, perfeito ou não.
Brasília, fevereiro
de 2016
Fonte: http://www.ajebrasil.org.br/
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