Agonia das Religiões


José Herculano Pires e o livro "Agonia das Religiões", pequeno trecho de um grande livro.

"O ponto crucial do problema religiosa chama-se hipocrisia. E a hipocrisia resulta das atitudes egoístas, da falta de compreensão do verdadeiro sentido da Religião, que é caminho e não ponto de chegada da espiritualização do homem. Os religiosos que pretendem atingir a santidade do dia para a noite, que se revestem de pureza exterior, encobrindo a podridão interior, são os hipócritas condenados veementemente no Evangelho.
A solução desse grave problema, que responde pela morte cíclica das civilizações, está na compreensão da verdadeira pureza do homem, do processo natural do seu desenvolvimento espiritual. Os artifícios purificadores só servem para mascarrar os indivíduos pretensiosos.


As práticas ascéticas (*) não podem ser forçadas. As paixões e os instintos do homem são manifestações de forças vitais que, sobre o controle da razão e do sentimento, podem e devem guiar o espírito nos rumos datranscedência.
Repetimos agora os ciclos agônicos do Oriente, da Grécia e Roma, de Israel, da Europa Medieval a explosão pornográfica sobrepõe-se aos instintos vitais e aos controles sociais. A agonia das religiões anuncia a morte da civilização condenada. Não obstante, há uma esperança para a brilhante civilização condenada. As forças do espírito reagem contra a derrocada moral. Como na queda do Bizâncio (**), enquanto os clérigos cantam e pregam em meio à derrocada há vigias de uma nova era espreitando o futuro nas almenaras (***). (...) Poluída, envenenada, devastada, ameaçada, a Terra dos Homens, nossa mãe, convida-nos a subir com Saint-Exupéry (****) para novas dimensões de uma realidade em que estamos perdidos.”

Prossegue Herculano:

“Todas as religiões atuais estão superadas pelo avanço geral da cultura terrena. Todas as estruturas sociais do nosso mundo estão peremptas. A própria cultura, que nos parece tão avançada, arrasta-se ainda amarrada aos conceitos de um passado morto. A maioria da população do globo sofre o suplício de Tântalo (*****). A miséria e as doenças consomem milhões de pessoas para que grupos de elites esbanjem fortunas colossais. Os gastos armamentistas sugam o suor e o sangue dos povos. O egoísmo não foi alijado dos corações e o exemplo do Cristo é encarado como simples lenda mitológica. A idéia de Deus se apaga diante da enormidade das ameaças e das calamidades que assolam as nações, mesmo as mais civilizadas. Seria absurdo pensarmos que essa situação infernal prosseguirá indefinidamente. O princípio da tensão máxima está em função de sermos forçados a avançar para situações mais dignas. Kardec viu tudo isso com extrema lucidez, como podem constatar na leitura das suas obras. Por isso não converteu o Espiritismo numa nova religião estática, segundo o conceito de Bérgson (******), mas ligou-o a todos os campos da cultura para que possa agir como uma religião dinâmica, aquela religião em espírito e verdade de que Jesus falou à mulher samaritana.”
“A perfeição não é alcançada quando não há mais nada a ser incluído, mas sim quando não há mais nada a ser retirado”.
“Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho, pois cada pessoa é única e nenhuma substitui outra. Cada um que passa em nossa vida passa sozinho, mas não vai só nem nos deixa só. Leva um pouco de nós mesmos, deixa um pouco de si mesmo. Há os que levam muito, mas há os que não levam nada. Essa é a maior responsabilidade de nossa vida, e a prova de que duas almas não se encontram ao acaso.”

(*) As práticas ascéticas tiveram origem no bramanismo, que predominava na metade da antiga Índia, antes do nascimento de Sakyamuni (Buda). A pintura e a escultura "Arhat" revelam a crueldade dessas práticas. Por exemplo: os praticantes suspendiam algo só com um braço, sentavam-se entre a bifurcação de dois galhos, ou chegavam ao cúmulo de praticar o "Zazen" (meditação profunda, com as pernas cruzadas) sentados numa tábua cheia de pregos. Houve religiosos que se mantiveram anos seguidos na mesma posição. Eles acreditavam que, perseverando em tais sofrimentos, conseguiriam atingir a Iluminação, ou melhor, sentir-se-iam iluminados.

(**) A queda de Bizâncio provocou um choque tão grande no mundo cristão quanto a queda de Roma, e novamente foi utilizada como marco final de uma época, a Idade Média.

(***) Fachos ou faróis nas atalaias ou torres. Sítio onde está luz, lanterna, farol.

(****) Autor do Pequeno Príncipe: Abaixo duas das suas inúmeras citações:

“A perfeição não é alcançada quando não há mais nada a ser incluído, mas sim quando não há mais nada a ser retirado”.

“ Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho, pois cada pessoa é única e nenhuma substitui outra. Cada um que passa em nossa vida, passa sozinho, mas não vai só nem nos deixa sós. Leva um pouco de nós mesmos, deixa um pouco de si mesmo. Há os que levam muito, mas há os que não levam nada. Essa é a maior responsabilidade de nossa vida, e a prova de que duas almas não se encontram ao acaso."

(*****) Na mitologia grega, Tântalo foi um mitológico rei da Frígia ou da Lídia, casado com Dione. Ele era filho de Zeus e da princesa Plota. Segundo outras versões, Tântalo era filho do Rei Tmolo da Lídia (deus associado à montanha de mesmo nome). Teve três filhos: NíobeDascilo e Pélope.
Certa vez, ousando testar a omnisciência dos deuses, roubou os manjares divinos e serviu-lhes a carne do próprio filho Pélope num festim. Como castigo foi lançado ao Tártaro, onde, num vale abundante em vegetação e água, foi sentenciado a não poder saciar sua fome e sede, visto que, ao aproximar-se da água esta escoava e ao erguer-se para colher os frutos das árvores, os ramos movia-se para longe de seu alcance sob força do vento.

A expressão suplício de Tântalo refere-se ao sofrimento daquele que deseja algo aparentemente próximo, porém, inalcançável, a exemplo do ditado popular "Tão perto e, ainda assim, tão longe".

(******) Henri Bergson, filósofo francês (paris 1859 - Paris 1941).Doutor em Letras em 1889, mestre de conferências na Escola Normal Superior em 1897, tornou-se professor no Colégio de França em 1900 e membro da Academia Francesa em 1914. Recebeu, em 1928 (por 1927), o prêmio Nobel de Literatura. É autor de uma filosofia espiritualista, preferindo a intuição à dedução como meio de acesso ao conhecimento. No fim de sua vida, aproximou-se do cristianismo, mas sem se converter.  A religião, como expoente máximo da potencialidade criadora do ser humano, é o que vê Bergson. O super-homem bergsoniano é o místico em ação.

Autoria do texto: Albana Azevedo
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